Prezado (a) leitor (a), seja bem-vindo (a), sempre, a este singelo espaço caseiro. Antecipo o meu sentimento de gratidão pela visita.
O precedente contido no informativo n. 691, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é um excelente julgado, na medida em que aborda vários assuntos relacionados ao direito direito penal e ao direito processual penal. A partir da interpretação gramatical do resumo da decisão do STJ, é possível afirmar que diante de uma denúncia já oferecida, não se exigiria a representação da vítima no crime de estelionato - antes do pacote anticrime - todavia, o ponto mais difícil de entendimento do precedente, pelo menos o que eu enfrentei, foi a questão da retroatividade da representação, hoje exigida, uma vez que percebi a existência de julgados antagônicos, de posicionamentos diferentes. E isto parece ser excelente no estudo da formação da norma, de um futuro entendimento consolidado, de uma jurisprudência, até mesmo de uma súmula. A decisão trazida no bojo do informativo 691 foi publicada em 8 de abril de 2021, tendo sido julgada em 24 de março de 2021. Tal decisão teve como Relator o Ministro Ribeiro Dantas, cujo processo relacionado é o HC 610.201/SP. Esta é a ementa da decisão: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. ESTELIONATO. LEI N. 13.964/2019 (PACOTE ANTICRIME). RETROATIVIDADE. INVIABILIDADE. ATO JURÍDICO PERFEITO. CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE. WRIT INDEFERIDO. 1. A retroatividade da norma que previu a ação penal pública condicionada, como regra, no crime de estelionato, é desaconselhada por, ao menos, duas ordens de motivos. 2. A primeira é de caráter processual e constitucional, pois o papel dos Tribunais Superiores, na estrutura do Judiciário brasileiro é o de estabelecer diretrizes aos demais Órgãos jurisdicionais. Nesse sentido, verifica-se que o STF, por ambas as turmas, já se manifestou no sentido da irretroatividade da lei que instituiu a condição de procedibilidade no delito previsto no art. 171 do CP. 3. Em relação ao aspecto material, tem-se que a irretroatividade do art. 171, §5º, do CP, decorre da própria mens legis, pois, mesmo podendo, o legislador previu apenas a condição de procedibilidade, nada dispondo sobre a condição de prosseguibilidade. Ademais, necessário ainda registrar a importância de se resguardar a segurança jurídica e o ato jurídico perfeito (art. 25 do CPP), quando já oferecida a denúncia. 4. Não bastassem esses fundamentos, necessário registrar, ainda, prevalecer, tanto neste STJ quanto no STF, o entendimento "a representação, nos crimes de ação penal pública condicionada, não exige maiores formalidades, sendo suficiente a demonstração inequívoca de que a vítima tem interesse na persecução penal. Dessa forma, não há necessidade da existência nos autos de peça processual com esse título, sendo suficiente que a vítima ou seu representante legal leve o fato ao conhecimentos das autoridades." (AgRg no HC 435.751/DF, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 23/08/2018, DJe 04/09/2018). 6. Habeas corpus indeferido. Com esse mesmo raciocínio, há a decisão proferida pelo Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, em 9 de junho de 2020 (HC 573093/SC): EMENTA HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CRIME DE ESTELIONATO. PRETENDIDA APLICAÇÃO RETROATIVA DA REGRA DO § 5º DO ART. 171 DO CÓDIGO PENAL, ACRESCENTADO PELA LEI N. 13.964/2019 (PACOTE ANTICRIME). INVIABILIDADE. ATO JURÍDICO PERFEITO. CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE. DOUTRINA. DOSIMETRIA. PRETENSÃO DE CONVERSÃO DA PENA CORPORAL EM MULTA. ART. 44, §2º, DO CÓDIGO PENAL. DISCRICIONARIEDADE DO JULGADOR. WRIT NÃO CONHECIDO. 1. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal e as Turmas que compõem a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. 2. A Lei n. 13.964/2019, de 24 de dezembro de 2019, conhecida como "Pacote Anticrime", alterou substancialmente a natureza da ação penal do crime de estelionato (art. 171, § 5º, do Código Penal), sendo, atualmente, processado mediante ação penal pública condicionada à representação do ofendido, salvo se a vítima for: a Administração Pública, direta ou indireta; criança ou adolescente; pessoa com deficiência mental; maior de 70 anos de idade ou incapaz. 3. Observa-se que o novo comando normativo apresenta caráter híbrido, pois, além de incluir a representação do ofendido como condição de procedibilidade para a persecução penal, apresenta potencial extintivo da punibilidade, sendo tal alteração passível de aplicação retroativa por ser mais benéfica ao réu. Contudo, além do silêncio do legislador sobre a aplicação do novo entendimento aos processos em curso, tem-se que seus efeitos não podem atingir o ato jurídico perfeito e acabado (oferecimento da denúncia), de modo que a retroatividade da representação no crime de estelionato deve se restringir à fase policial, não alcançando o processo. Do contrário, estar-se-ia conferindo efeito distinto ao estabelecido na nova regra, transformando-se a representação em condição de prosseguibilidade e não procedibilidade. Doutrina: Manual de Direito Penal: parte especial (arts. 121 ao 361) / Rogério Sanches Cunha - 12. ed. rev., atual. e ampl. - Salvador: Editora JusPODIVM, 2020, p. 413. 4. Ademais, na hipótese, há manifestação da vítima no sentido de ver o acusado processado, não se exigindo para tal efeito, consoante a jurisprudência desta Corte, formalidade para manifestação do ofendido. 5. Conforme pacífica jurisprudência desta Corte Superior, fixada a pena corporal nos patamares delineados no art. 44, § 2º, do Código Penal, compete ao julgador a escolha do modo de aplicação da benesse legal. Além disso, não é socialmente recomendável a aplicação da multa substitutiva em crimes cujo o tipo penal prevê multa cumulativa com a pena privativa de liberdade. 6. Habeas corpus não conhecido. É importante esclarecer, ainda, que há entendimento no Supremo Tribunal Federal (STF) no mesmo sentido da irretroatividade da representação nos processos com denúncia já oferecida. Desse modo, até a presente data, à luz do entendimento dos tribunais superiores, e conforme decisão veiculada pelo informativo STJ n. 691, parece correto dizer que a alteração legislativa realizada pelo pacote anticrime, no que se refere à retroatividade da representação no crime de estelionato, sofreu uma adequação que visa à segurança jurídica, mas o assunto abordado ainda não está consolidado. Não é possível afirmar que entendimento x, y ou z forma a jurisprudência consolidada de um tribunal. Há precedentes e, após decisões reiteradas, possivelmente surgirá um entendimento único, até mesmo uma súmula. Com o meu respeito e consideração, Wilton Processo penal - busca e apreensão e teoria da aparência | Wilton Moreira da Silva Filho - 16h571/7/2021
Ementa extraída do julgado:
"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES. RECONVENÇÃO. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. MORTE DO TITULAR. COBRANÇA DE VALORES RELATIVOS À COPARTICIPAÇÃO NAS DESPESAS DE INTERNAÇÃO. CLÁUSULA CONTRATUAL QUE CONDICIONA A MANUTENÇÃO DA DEPENDENTE COMO BENEFICIÁRIA À QUITAÇÃO DA DÍVIDA CONTRAÍDA PELO FALECIDO. ABUSIVIDADE. JULGAMENTO: CPC/2015. 1. Ação declaratória de inexistência de débito c/c restituição de valores, ajuizada em 04/04/2019, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 18/06/2020 e atribuído ao gabinete em 26/10/2020. 2. O propósito recursal é decidir sobre a responsabilidade do cônjuge supérstite (dependente) pelas dívidas contraídas pelo falecido (titular) junto à operadora de plano de saúde. 3. Falecendo o titular do plano de saúde coletivo, seja este empresarial ou por adesão, nasce para os dependentes já inscritos o direito de pleitear a sucessão da titularidade, nos termos dos arts. 30 ou 31 da Lei 9.656/1998, a depender da hipótese, desde que assumam o seu pagamento integral. 4. A conduta da recorrida, de impor à dependente a obrigação de assumir eventual dívida do falecido titular, sob pena de ser excluída do plano de saúde, configura, em verdade, o exercício abusivo do direito de exigir o respectivo pagamento, na medida em que, valendo-se da situação de fragilidade da beneficiária e sob a ameaça de causar-lhe um prejuízo, constrange quem não tem o dever de pagar a fazê-lo, evitando, com isso, todos os trâmites de uma futura cobrança dirigida ao legítimo responsável (espólio). 5. Hipótese em que, a pretexto de exercer regularmente um direito amparado no contrato, a recorrida desvirtua o fim econômico e social dos arts. 30 e 31 da lei 9.656/1998, pois se vale da garantia neles assegurada como moeda de troca para coagir o dependente à quitação da dívida deixada pelo titular que morreu. 6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido." Constituição Federal (CRFB), art. 100, §6º: "Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (...) § 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares, originários ou por sucessão hereditária, tenham 60 (sessenta) anos de idade, ou sejam portadores de doença grave, ou pessoas com deficiência, assim definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório." Precedente do STJ sobre remição de pena | noções de direito / Wilton Moreira da Silva Filho - 21h2227/5/2021
Direito processual penal/nulidades | noções de direito / Wilton Moreira da Silva Filho - 0h4323/5/2021
Direito empresarial - Informativo STJ 688 | noções de direito / Wilton Moreira da Silva Filho - 0h1911/5/2021
Conceito de súmula
A ideia inicial do conceito de súmula parece estar associada à atividade exercida pelo Poder Judiciário, especificamente por meio dos seus tribunais, cujos órgãos interpretam os atos legislativos do sistema jurídico brasileiro e, nesse contexto, a partir de seus precedentes, podem contribuir para o início do desenvolvimento e formação da jurisprudência, que é uma fonte do direito, além da segurança jurídica. Para Reale (1996), “Pela palavra ‘jurisprudência’ (stricto sensu) devemos entender a forma de revelação do direito que se processa através do exercício da jurisdição, em virtude de uma sucessão harmônica de decisões dos tribunais.” Dessa maneira, os magistrados, que no âmbito de suas atividades - a partir de princípios - interpretam as leis, corrigem atos legislativos, realizam a análise, o processo de filtragem em camadas, de purificação do substrato normativo, por meio de uma atividade decisória submetida a um órgão colegiado, que atua de forma técnica, formarão entendimentos a respeito de determinadas matérias, muitas vezes polêmicas, mas que serão as fundações sobre as quais a aplicação das leis escritas do direito garantirão segurança jurídica e a correção, sim, de possíveis equívocos tanto da atividade de órgãos que precederam à análise da matéria, quanto da própria lei em sentido amplo, que por ser lei não traz a chancela, a garantia de que não contém uma norma violadora de direitos. É possível corrigir a aplicação de uma lei. É possível (re) construir o direito. Por conseguinte, afirma-se que as decisões judiciais existem, são válidas, produzem efeitos e, quando analisadas por órgãos colegiados, essas decisões podem ser interpretadas - em um mesmo tribunal - de modo divergente. É a construção do direito, a edificação da norma jurídica! Cada decisão forma, sim, uma norma jurídica. Todavia, não se pode afirmar que uma decisão isolada representa a jurisprudência de um tribunal. A jurisprudência está associada à noção de decisões que são são tomadas reiteradamente pelos tribunais acerca da matéria objeto de análise. Existe a possibilidade de essas decisões que revelam o mesmo entendimento do tribunal, que já constam da jurisprudência da corte, formarem enunciados que integrarão o conjunto das súmulas do tribunal. Em matéria penal, por exemplo, existe um enunciado que trata do uso de algemas. A autoridade ou o agente da autoridade deverá seguir o que determina o enunciado: usar as algemas nos termos do enunciado. Assim, o Poder Judiciário realiza importante papel não só na composição de litígios. Tal Poder da República interpreta as leis em sentido amplo ou não, a exemplo de decretos e medidas provisórias e, a partir da análise das normas contidas nesses atos legislativos, possibilita a formação de outras normas jurídicas, fato que revela papel importante para a formação da jurisprudência e para a segurança jurídica no Brasil. BIBLIOGRAFIA REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. Súmulas do STJ - Enunciado n. 648 | noções de direito / Wilton Moreira da Silva Filho - 0h4720/4/2021
April 01st, 2021 The man who asked for help | posted by Wilton Moreira da Silva Filho - 2:18 am1/4/2021
|
AUTOR:Wilton Moreira da Silva Filho ARQUIVOS
November 2024
CATEGORIASHISTÓRICO
November 2024
|