O ACESSO A ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO DE UM INQUÉRITO POLICIAL, EM QUALQUER SITUAÇÃO, É AMPLO? POR WILTON MOREIRA DA SILVA FILHO / WILTONMOREIRA.COM.BRInquérito policial é um dos meios de elucidação de infrações penais e sua autoria. É presidido pela autoridade policial e uma de suas características é o sigilo.
A fase inquisitorial antecede a chamada ação penal. No inquérito, são obtidos indícios que futuramente serão avaliados pelo Poder Judiciário (juízo de reprovação da conduta). De acordo com o Código de Processo Penal (CPP), o inquérito policial é um procedimento administrativo sigiloso. Em seu art. 20, dispõe que "a autoridade policial assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato do fato ou exigido pelo interesse da sociedade". Em razão do artigo citado, o delegado de polícia dispõe de mecanismos para assegurar o sigilo do inquérito, a fim de realizar diligências policiais com êxito. Neste contexto, destacam-se situações cuja publicidade tem o potencial de afetar o planejamento e realização da investigação policial. A ausência de publicidade em determinados casos não visa apenas à garantia de uma ação exitosa dos órgãos de investigação. Há questões de natureza constitucional que a fundamentam, a exemplo do direito à imagem e à presunção de inocência. O art. 5º, inciso X, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), garante o direito à imagem, nestes termos: "São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação." No que se refere ao princípio da presunção de inocência, dispõe a CRFB: "Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória." (CRFB, art. 5º, inciso LVII) No âmbito da jurisprudência, é relevante citar a súmula vinculante n. 14, que garante ao defensor o acesso amplo aos elementos de prova já documentados. Neste contexto, o órgão com atribuição de polícia judiciária não poderá negar acesso aos autos do inquérito policial, conforme fixou o Supremo Tribunal Federal (STF): "É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa." (Enunciado n. 14 das Súmulas Vinculantes) Ressalta-se que o acesso amplo ao qual se refere o enunciado n. 14 refere-se aos elementos de prova já documentados, o que fortalece a possibilidade de êxito no contexto de medidas relacionadas à elucidação da infração penal ou até mesmo ao cumprimento de medidas cautelares pelos órgãos que integram a persecução penal. Além de a questão do sigilo estar associada a normas da CRFB, processuais penais e fixadas pelo STF, na atualidade existe um assunto que tem sido objeto de difusão midiática e que mantém relação de igual modo com o sigilo: a delação premiada, espécie de colaboração premiada, prevista na lei n. 12.850, de 2 de agosto de 2013. Prevê o art. 3º, §1º, da lei que define organização criminosa, que a licitação poderá ser dispensada quando houver necessidade justificada, nos termos seguintes: "§1º Havendo necessidade justificada de manter sigilo sobre a capacidade investigatória, poderá ser dispensada licitação para contratação de serviços técnicos especializados, aquisição ou locação de equipamentos destinados à polícia judiciária para o rastreamento e obtenção de provas previstas nos incisos II e V." No art. 5º, inciso n. V, da citada lei de organização criminosa (ORCRIM), cuida-se do sigilo como um direito do colaborador: "Art. 5º (...) V - não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito; (...)" A respeito da matéria, o STF ratificou o direito previsto no art. 5º, V, da lei n. 12.850/2013, desta forma: "Ementa: PENAL. PROCESSO PENAL. COLABORAÇÃO PREMIADA. PEDIDO DE ACESSO AO CONTEÚDO DE DEPOIMENTOS COLHIDOS. DECLARAÇÕES RESGUARDADAS PELO SIGILO NOS TERMOS DA LEI 12.850/2013. 1. O conteúdo dos depoimentos prestados em regime de colaboração premiada está sujeito a regime de sigilo, nos termos da Lei 12.850/2013, que visa, segundo a lei de regência, a dois objetivos básicos: (a) preservar os direitos assegurados ao colaborador, dentre os quais o de “ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados” (art. 5º, II) e o de “não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito” (art. 5º, V, da Lei 12.850/2013); e (b) “garantir o êxito das investigações” (arts. 7º, § 2º). 2. O sigilo perdura, em princípio, enquanto não “(…) recebida a denúncia” (art. 7º, § 3º) e especialmente no período anterior à formal instauração de inquérito. Entretanto, instaurado formalmente o inquérito propriamente dito, o acordo de colaboração e os correspondentes depoimentos permanecem sob sigilo, mas com a ressalva do art. 7º, § 2º da Lei 12.850/2013, a saber: “o acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia, como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências em andamento” (Rcl 22009-AgR, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, DJe de 12.5.2016). 3. Assegurado o acesso do investigado aos elementos de prova carreados na fase de inquérito, o regime de sigilo consagrado na Lei 12.850/2013 guarda perfeita compatibilidade com a Súmula Vinculante 14, que garante ao defensor legalmente constituído “o direito de pleno acesso ao inquérito (parlamentar, policial ou administrativo), mesmo que sujeito a regime de sigilo (sempre excepcional), desde que se trate de provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, consequentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentados no próprio inquérito ou processo judicial” (HC 93.767, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, DJe de 1º.4.2014). 4. É certo, portanto, que a simples especulação jornalística a respeito da existência de acordo de colaboração premiada ou da sua homologação judicial ou de declarações que teriam sido prestadas pelo colaborador não é causa juridicamente suficiente para a quebra do regime de sigilo, sobretudo porque poderia comprometer a investigação. 5. Agravo regimental a que se nega provimento." (Pet 6164 AgR, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 06/09/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-201 DIVULG 20-09-2016 PUBLIC 21-09-2016) Desse modo, há previsão de sigilo dos procedimentos de investigação no sistema jurídico brasileiro, contudo, esta restrição à publicidade não é absoluta, devendo a persecução penal observar os princípios e regras constitucionais, atos legislativos e normas fixadas pela jurisprudência. http://wiltonmoreira.com.br
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AUTOR:Wilton Moreira da Silva Filho ARQUIVOS
November 2024
CATEGORIASHISTÓRICO
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