Dia Nacional da Alfabetização: o estudo ao lado das crianças da pizzaria. Por Wilton Moreira.14/11/2016
Relembro do Farol, bairro em que passei minha infância. Lá, havia uma pizzaria na qual crianças faziam o papel de guardadores de carro. Nas horas livres, costumava ensinar o pouco que sabia aos meus novos amigos, que tiveram destinos diferentes. As crianças da pizzaria costumavam chegar à tardinha. Recordo-me que era um grupo de aproximadamente cinco garotos que saíam de suas casas na tentativa de ganhar gorjetas de clientes do estabelecimento. Não eram meninos de rua. Pareciam estar na rua apenas naquele horário. Conversava bastante com as crianças da pizzaria que ficava em frente da nossa casa. Passei a chamá-las de amigos e a ensinar informalmente o pouco que sabia. Na época, eu costumava assistir às sessões do tribunal do júri que meu pai presidia. Nelas, percebia que o banco dos réus majoritariamente era ocupado por adultos que tiveram uma infância semelhante àquela dos meus novos amigos. O paradigma de educação que eu tinha em minha família associado ao modelo de ensino do meu eterno Colégio Diógenes Jucá Bernardes, que robustecia os conceitos associados à educação e cidadania conduziram-me a passar horas ensinando aos garotos. Com o tempo eu percebi que para eles mais importante do que a simplicidade das dicas de estudo que eu transmitia era a minha amizade, a atenção. Para mim, nós sempre estivemos na mesma posição. A única diferença era que ocupávamos lugares diferentes em nossa sala de aula, que era o muro da pizzaria! Carlos geralmente ficava na parte mais alta. Ele e seu irmão eram os mais tranquilos, focados. Marquinho, o mais extrovertido, ao meu lado, conforme se constata na foto do post, que me conduz à infância, à ideia de que é importante fazer o bem sem nada pedir em troca, de só olhar o próximo de cima para baixo para ajudá-lo a se levantar, estendendo-lhe a mão. Quando nos mudamos de lá do bairro Farol, perdi o contato com os meus amigos, os meninos da pizzaria. Sempre que passava nas proximidades do estabelecimento, eu me recordava deles. Vários anos depois, em uma festa de formatura, um jovem veio ao meu encontro e perguntou: "É o Wilton"? Era o Carlos, o que está de camisa verde na foto, acima de Marquinho, de xadrez. Fiquei feliz em revê-lo e em saber que era funcionário do DJ mais famoso da cidade, por seu pioneirismo. Por outro lado, soube que o destino foi cruel com as outras crianças da pizzaria. Somente Carlos e seu irmão estavam vivos. Os outros da turma haviam sido vitimados pela violência. Desse modo, neste Dia Nacional da Alfabetização, relembro das crianças da pizzaria, da importância da educação, de compartilhar o conhecimento e, sobretudo, de fazer a diferença na vida de alguém. http://wiltonmoreira.com.br
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AUTOR:Wilton Moreira da Silva Filho ARQUIVOS
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